Adoro momentos cinematográficos.
Sempre que estou prestes a vivenciar um deles sinto cócegas na nuca, como se tivesse sendo observada por tudo e por todos.
"Hope is a thing with feathers that perches on the soul."
Nesse caso, Hope era eu. As penas, meu Ray Ban. A alma, o muro frio e ligeiramente molhado do sereno. Sim, "sereno" existe. Aprendi isso com a Cenoura.
Além de frio e molhado, o muro era alto. Não ALTO alto, mas alto o suficiente pra me pedir um pulinho. Mas é claro que TIVE que sentar lá em cima. Sou mimada, não vivo sem meu momento cinematográfico.
Lá de cima, o mundo era esquisito. Aquele friozinho ensolarado estava me deixando nostálgica; fui atropelada de uma só vez por insanas memórias de La Rubia Divina botando fogo no Kilkenny e nas minhas entranhas ao som de Guns n' Roses enquanto minha blusa rosa choque implorava-a para olhar pra mim. Lembrei daquela música daquela garota que berra de corpo e alma "olha a minha cara de quem gosta de você". Fiz a minha "cara de quem gosta de você" pra ela. E depois, só pra fazer charme, caprichei no sotaquezinho brasileiro. O Brian riu e falou que eu não prestava mesmo.
Agora que relembro tudo isso, outra frase me vem a cabeça - na verdade, o trecho de um livro: "Poderia contar as mentiras mais formidáveis para elas. Aventuras impossíveis de acontecer pra quem talvez nunca saísse de uma cidade tão pequena. Mas eu estava ali, também, porque queria que minhas mentiras fossem uma verdade incontestável ao longo do tempo." Pena que eu não sabia mentir.
Fiquei triste e decidi não pensar mais nisso.
Eu não estava exatamente confortável lá em cima do muro. Minhas pernas estavam longe do chão e sem nenhum apoio. Não podia escorregar nem para frente nem para trás sem correr o risco de cair. Não tinha vontade de conversar. Não tinha paciência para escutar. Não tinha nada além de uma tentadora possibilidade de me entreter olhando o mundo.
Não via pessoas, e sim seus sentimentos. Suas vontades, suas preocupações. Vi que todos eram iguais, tanto por fora, quanto por dentro. As mesmas roupas das mesmas lojas, mas só em cores diferentes. Os mesmos comentários sobre quais vips conseguiram pra quais baladas. A mesma hostilidade para com o diferente e a mesma necessidade de impressionar.
Devia ter ficado mais triste ainda, mas não foi bem assim.
Fiquei feliz porque estava lá no alto, longe de tudo aquilo e de toda aquela gente. Fiquei feliz porque não precisava de nada disso, e apesar de estar imersa no caos, estava intacta e ebriamente sóbria sentada no meu murinho. Fiquei feliz porque a Cenoura finalmente desligou o celular e soltou um "QUE FRIOOO", daquele jeito que só nós entendemos, e me puxou de volta pro chão e pra vida que tanto adoro.
Fiquei feliz porque ganhei meu momento cinematográfico.
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